quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

O Parnasiano!? (A Terceira Lâmina-Zé Ramalho-1981)

























Prestes a iniciar aquele ciclo terrivelmente chato de vestibulares e já com o saco cheio de repassar um interminável rol de sínteses, formulinhas e truques, recordo de ter me deparado com algum material sobre escolas literárias.

Aquela coisa absolutamente desnecessária para nossa existência: classicismo, realismo, romantismo...rococó, sei lá. Tinha mais ou menos decorado as características estéticas de cada escola. Mas tinha o tal do parnasianismo.

E o parnasianismo? Foi aí que alguém me deu a seguinte dica: “se na prova de literatura você se deparar com um texto ininteligível, que você não entende lhufas. É parnasianismo”. Essa dica surge novamente quando pensei em como indicar esse “A Terceira Lamina” do Zé Ramalho.

Realmente, e para o exclusivo uso desse nosso espaço, decreto: Zé Ramalho é parnasiano. Tá aí o disco para não me desmentir. Até mesmo, há coisa de uns dez anos, ele gravou um “20 anos – Antologia Acústica” que, embora seja bom, se destaca justamente por um encarte onde há uma engraçada tentativa de explicar suas letras.

Mais. Outro dia, no Canal Brasil, num programa que pessoalmente acho uma tragédia pela indelicadeza do entrevistador (o cara fica olhando para o relógio indisfarcadamente), estava lá o Zé Ramalho falando de um disco seu totalmente fora de catálogo e que estaria valendo uma nota. No meio da entrevista, num generoso ato de humildade, ele afirma suspeitar que a raridade do disco se deve ao fato de ter a maioria das cópias sido queimada num incêndio que vitimou o estúdio. Após uma tentativa desesperada do entrevistador em justificar sua escolha do disco para aquele programa, Zé Ramalho concede um certo elogio ao seu trabalho, mas...ressalva: “era um momento todo peculiar nosso”. Ou algo assim. Disse tudo, se confessou parnasiano!

Por tudo isso, não tenho como ficar relacionando cada faixa com qualquer coisa que seja. São todas peculiares, também. Destaco algumas pelo prazer exclusivamente indeterminado que sinto, ou por algum fragmento de letra que suponho “profundo”.

“Terceira Lâmina”: “acho bem mais do que pedras na mão dos que vivem calados, pendurados no tempo...”, “afastado da terra, ele pensa na fera que o começa a devorar”. Olha o parnasianismo aí nesse segundo fragmento!

“Atrás do Balcão”: Essa é outra estranha. Lembra quase uma história que me ocorre seja triste...não, trágica. Isso! acho que trágica define melhor. Ou não...sabe lá deus.

“Kamikaze”: É minha música favorita de tudo que conheço de Zé Ramalho. Só ouvindo. Recordo com clareza o imenso prazer que senti quando a escutei pela primeira vez. O que é isso? O cidadão ta relatando algo...um manifesto? Não, manifesto certamente não. Francamente: ele tá lá falando: “Zeba, veja esta que sei que você vai gostar”.

“Cavalo do Cão”: A participação da Elba Ramalho é perfeita.

Então é isso. Não caiu nada sobre parnasianismo naquele vestibular. Também não prestei outros, já que passei neste primeiro. Assim nunca pude ter certeza se a dica que recebi era séria.

(ZEBA)

quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

links

Hoje vou relacionar alguns sites úteis para a garimpagem de álbuns clássicos para nós aqui do site:

http://alltribes.blogspot.com/
(excelente, discografias recentes do Arnaldo Antunes, Karnak, Uakti, Novos Baianos, além de muitos outros internacionais)
http://brnuggets.blogspot.com/
(mais voltado pra obscuridades, vale a curiosidade)
http://br-instrumental.blogspot.com/
(muito bom, obviamente com ênfase em instrumentais. Recomendo Moacir Santos, Medusa, João Donato, Pepeu Gomes, Banda Black Rio)
http://feijaotropeiro.blogspot.com/
(variado, recomendo Ana Cañas, o Lenine novo etc)
http://mercadodepulgas.blogspot.com/
http://trabalhomental.blogspot.com/
(comandado por um sampaulino de bom-gosto)
http://comberocks.blogspot.com/
(mias rock pesado, o que inclui os nacionais Azul Limão, Edu Ardanuy, Anthares, Korzus, Matanza, os Cascavelletes, os Mutantes, Platina, Sarcófago, Sepultura, Taurus e coletâneas clássicas com SP Metal)
http://erawilson.blogspot.com/
(um dos meus preferidos, bem variado entre nacional/internacional)
http://www.lagrimapsicodelica.blogspot.com/
(site pesado de abrir, mas vale muito a pena a garimpagem)

Divirtam-se e não fiquem ansiosos...

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

Selvagem? - Paralamas do Sucesso (1986)



Para os Paralamas do Sucesso, e para toda a geração "rock Brasil" dos anos oitenta, "Selvagem?" representou a transição da adolescência para a idade adulta. Trata-se do primeiro disco de uma banda nacional com temática mais sofisticada, produção caprichada e a incorporação de elementos até então pouco utilizados nos trabalhos aqui realizados. No final, os Paralamas acertaram a mão e, por intermédio desse trabalho, acabaram por influenciar toda a obra imediatamente posterior de sua geração.

Produzido por Liminha, "Selvagem?" foi gravado e lançado no primeiro semestre de 1986. Os Paralamas vinham do sucesso de crítica e público obtidos com o deliciosamente adolescente "O Passo do Lui" (já resenhado aqui), mas queriam dar um salto qualitativo na carreira. Nas palavras do baterista João Barone, nada de muito especial - "os Paralamas do Sucesso só queriam fazer algo diferente e não repetir a fórmula do disco anterior".

"Selvagem?" abre com "Alagados", um dos maiores hits do disco e do grupo. Com uma deliciosa levada de guitarra, a canção faz um relato da dura realidade da vida nas favelas brasileiras, refletindo em parte a crise econômica enfrentada pelo Brasil durante a "década perdida" - os anos oitenta. Gilberto Gil participa da música - ele contribui ainda com "A novidade", parceria do baiano com os três paralamas.

Depois de "Alagados" aparecem, em sequência, o rock de protesto "Teerã", a já citada "A novidade", a divertida "Melô do Marinheiro" e "Marujo Dub", que mostra toda a influência que o trio recebia, nesse período, de gente como Yellowman, Sparrow, Toure Kundá e Fela Kuti. Conexão Jamaica-África-Brasil.

Para quem tem o vinil, o lado B começa com a pesada "Selvagem", uma canção de letra forte e contundente:

"A polícia apresenta suas armas
Escudos transparentes, cacetetes
Capacetes reluzentes
E a determinação de manter
Em seu lugar

O governo apresenta suas armas
Discurso reticente, novidade inconsistente
E a liberdade cai por terra
Aos pés de um filme de Godard

A cidade apresenta suas armas
Meninos nos sinais, mendigos pelos cantos
E o espanto está nos olhos de quem vê
O grande monstro a se criar

Os negros apresentam suas armas
As costas marcadas, as mãos calejadas
E a esperteza que só tem quem tá
Cansado de apanhar"

O disco não era só de protesto e denúncia, porém. Talvez interessados em manter certos vínculos com seus discos anteriores, os Paralamas gravaram duas canções mais leves - "A dama e o vagabundo", que fala das dificuldades da vida a dois, e "Você", clássico setentista de Tim Maia. Como não podia deixar de ser, as duas músicas atingiram os primeiros lugares das paradas. O disco tem ainda a alegrinha "There´s a party", com a voz desafinada de Herbert Vianna em seu estado mais puro. Um deleite para os fãs do grupo.

O resto é história. Depois de "Selvagem?", os Paralamas foram alçados a outro patamar dentro do que se chama de Música Popular Brasileira. Se isso é bom ou ruim, não vem ao caso. O importante é escutar "Selvagem? com atenção, para se captar todos os detalhes desse trabalho tão instigante e tão importante para a cena rock no Brasil.

André Xampu